Autor: Pedro Fagundes de Borba
Considerando toda a literatura já produzida até hoje, ou pelo menos aquela que ainda é lida, pois o tempo não a descartou nos deparamos com inúmeros livros, de diversas partes do mundo. Cada obra de literatura fala sobre seu autor, sua cultura, o lugar onde vive os pensamentos, as relações sociais e todo um imenso subjetivismo ali presente. Há ali um jogo muito poderoso entre o artístico e o real, mesmo que a obra não seja parecida com a realidade. A alma do escritor e povo está ali posta.
No caso dos árabes, uma obra muito peculiar, muito única chama dessa maneira a atenção: O livro das mil e uma noites. Pois é um clássico da literatura, e fala muito sobre os árabes, embora a história principal seja persa. Gira em torno do rei Xariar e de Sherazade. O primeiro é um rei que, após ver sua esposa com um escravo, a executa e decide se vingar de todas as outras mulheres. As chama ao palácio, passarem a noite com ele, executando-as pela manhã. Sherazade, como grande contadora de histórias, se oferece a ir. E passa a lhe contar histórias neste momento, as interrompendo pela manhã, sempre num ponto emocionante. Xariar fica querendo saber o resto e a poupa cada noite. Após mil e uma noites, ele amolece, desiste de matá-la e se casam.
Esta história principal acontece na Pérsia, apesar da maioria dos textos, da maioria das versões estarem escrito em árabe. Dentro deste enredo, se desenrolam as outras histórias, contadas pela narradora. São ricas em elementos folclóricos e mitológicos, tramas, vinganças, acordos e vários outros temas. Todos com forte associação entre si, criando enredos grandiosos. Algumas das mais famosas histórias são Simbad o Marujo, Aladim e Ali Babá e os quarenta ladrões. Especialmente a última, apresenta grande enredo e personagens, ainda que não estejam presentes em todas as versões.
Porque este é outro ponto curioso da obra. Não há um autor ou autores nomeados ou uma versão única. É uma coleção de histórias árabes, que variam de versão para versão, não se conhecendo quem fez. Na verdade, foi o próprio povo. O que garante a unidade, a existência da ideia de um livro aqui são eles terem o enredo principal. Muito provável que sejam histórias populares, contadas entre as pessoas, registradas por alguém. E nisso já se carrega a profundidade e a grandeza. Afinal, se está ali escrito pensamentos coletivos, ideias grandes e histórias que as pessoas gostam. Então as retrata com profundidade.
São contos orientais essencialmente, principalmente do Oriente Médio. Uma parte considerável é síria. No ocidente, ficaram conhecidas a partir do século XVIII, após o francês Antoine Galland viajar a Síria, ouvir e compilar as histórias, publicando na Europa, resultando em grande sucesso. Contam literariamente os povos árabes e falaram muito sobre eles e diversos outras questões humanas. São até hoje lidas no mundo todo.
Porque são muito boas, e profundamente humanas os contos das mil e uma noites. Conseguem falar com as pessoas de modo muito geral, apresentando culturas em sua profundidade. Por isso tornou-se um dos grandes livros da humanidade, mostrando coisas que outros lugares não conheciam. Ou daquela forma, ao menos. Pela maneira como fala de cultura, contando grandes histórias, e trazendo o melhor da literatura, com os personagens vivendo e representando, é o maior livro árabe de todos os tempos. Nenhum outro foi tão direto e profundo. Cada conto traz algo grande, humano e arábico. Como outras grandes obras ajudam a entender pontos obscuros ou difíceis sobre nós. Fala sobre um lugar, com características de vários. Por isso também tão bom. É um dos maiores tesouros da literatura e das artes.