Autor: Pedro Fagundes de Borba
Este complexo seria uma das mais fortes características brasileiras, correspondendo ao desprezo que boa parte dos brasileiros teria pelo brasileiro, pelo feito por nós e que nos caracteriza. O complexo de vira lata surge no sentido de não nos valorizarmos, não vermos o Brasil e suas produções como algo válido, de qualidade. Mais ainda, de considerarmos que somos ruins, fracos, que somente o internacional, aquilo que é gringo é bom, uma vez que não temos cultura, ou temos uma ruim.
A ideia de uma cultura ruim é bastante densa e precisa ser entendida, pois, uma vez que os humanos que produzem cultura, esta é, a uma forma, um reflexo destes, de suas maneiras de interagir, de pensar e de criar seus jeitos de ser. Dizem então que o brasileiro seria um narciso às avessas, que cospe na própria imagem, justamente por vê-la como negativa, não ver a si mesmo de maneira boa, achando que as coisas gringas efetivamente boas.
É bastante verdadeiro que todo brasileiro já falou mal do Brasil, por várias razões, a mais destacada sendo a malandragem e a corrupção. Por razões políticas, mas não somente, nos vemos como muito corruptos, sempre tentando levar vantagem, pensando sempre no melhor para nós, desprezando o coletivo e o bem comum. Falamos muito disto em relação aos políticos, mas estes são também um reflexo nosso. Portanto, é bastante brasileiro ver o Brasil como algo negativo, embora cada um se veja normalmente como uma exceção a esta regra, sendo alguém bom, muitas vezes nem sendo daqui, sendo um estrangeiro nascido em terras brasileiras.
O complexo, então, ganha a forma de ser algo que não considera válido os pensamentos e a cultura própria como legítima, ou como algo a ser vista. Varia então desde considerar como imitações pequenas e provincianas de culturas do hemisfério norte até ser uma cultura degenerada, carregada de aspectos negativos, normalmente relacionados com mestiçagem e uma suposta degeneração cultural e racial que existiria. Mestiçada, a cultura brasileira seria suja, nojenta e degenerada. Entre outras formas do complexo, podem ser destacadas estas.
Dos nacionalismos que surgiram, buscavam contrapor estas ideias de algumas maneiras. Desde valorizar o povo brasileiro como mistura do mundo, tanto quanto entender as características nacionais, e ver de maneira humana, seres reais e complexos, na realidade nacional. Mesmo quando foram abandonadas as noções raciais, sobretudo após a queda do nazi-fascismo, o complexo de vira lata não morreu, adotando novas formas, sendo de fato uma característica forte em alguns setores e partes culturais do Brasil.
Dentre isto, entretanto, se o Brasil nem sempre serve como fonte cultural para a maioria, ele passa a ser entendido e visto, unindo produções nacionais com estrangeiras, que caracteriza boa parte dos que falam e pensam sobre o país. A cultura, como do resto do mundo, tem suas características locais e formas, não sendo sagrada ou preciosa, mas real, valendo a pena ser vista e entendida. O complexo acaba fazendo parte disto, como uma forma negativa de se entender e ver a coisa, por um desgosto ou ódio de narciso às avessas. Neste sentido, o nacionalismo seria nos entendermos como parte da realidade brasileira, vendo suas características, formas, semelhanças e relações com outros lugares do mundo.