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Pedro Fagundes de Borba

Autor: Pedro Fagundes de Borba

Cena pintada

23/8/2020 - Várzea Paulista - SP

      ETA Hoffmann, escritor alemão, teve bastante marca de elementos fantásticos em sua obra. Com estes trouxe pesadas reflexões sobre algumas naturezas artísticas, ao que se conectam, do que falam sobre, também marcado pela estética romântica. O conto “Jacques Callot” mostra, apesar de não estar em um ambiente de irrealidade confirmada, uma conexão com estas ideias, o poder, alcance e constituição de uma arte, no caso o protagonista sem nome mira para as pinturas de seu mestre Callot.

  Porque não conseguia parar de olhar para as figuras de seu ousado mestre. As olhava, eram quase sempre traços arrojados sugerindo alguma coisa, e não lhe saíam da cabeça. Composições criadas pelos elementos mais heterogêneos, milhares e milhares de figuras lhe vinham, adquirindo vida, vindo ás vezes do plano mais remoto, se aproximando e saltando brilhantes e nítidas para o primeiro plano. Nenhum outro mestre fez aquilo como Callot, aquela abundância de elementos distintos, ao lado do outro, mantendo a singularidade e se perfilando como um todo.

   Sua arte extrapolava regras intrínsecas da pintura, talvez fossem apenas reflexos das fantásticas e mágicas visões que a magia das suas fantasias superexcitava. Mesmo em suas representações da realidade, havia fisionomia cheia de vida bastante peculiar, proporcionando às figuras, aos agrupamentos, algo de insólito familiar. Mesmo a mais comum das cenas, como uma dança de roceiros, aparece no brilho de uma originalidade, a índole dedicada ao fantástico é atraída de forma estranha. Ironia, colocando humano em conflito com animal escarnece o homem com sua pobre azáfama, habita somente o espírito profundo. As ridículas figuras animais e humanas de Callot revelavam assim as insinuações secretas, sob o véu do grotesco, ao espectador sério e insistente.

     Callot foi destemido e ousado em sua vida, assim como nos desenhos. Negou a Richelieu registrar a tomada de Nancy, dizendo ser preferível cortar o dedo, eternizar no talento a humilhação dos nobres e da pátria. Um poeta ou escritor que agora tivesse em seu espírito figurações românticas da vida comum, representando agora, em estilo raro e estranho, não poderia dizer que trabalhava á maneira de Callot, assim se desculpando ao mestre?

      Aquelas pinturas, talvez pela sensibilidade do protagonista, conseguiam reunir, sintetizar, em vários agrupamentos coisas diversas, não necessariamente colocadas na materialidade pintada ali, mas relacionáveis, associáveis, talvez presentes na mesma metafísica do concreto representado, o que estava para além do físico. Além, ali pintado, também se encontravam os diversos elementos do autor que constituíam o pintado, tinham com ele relação com o representado, o inspiravam. A realidade de Callot, complexa, saía pintada, trazendo, quando vista, tudo que a compunha.

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