Autor: Pedro Fagundes de Borba
Florbela Espanca, considerada a maior voz feminina da literatura portuguesa tem, em seus versos uma sensibilidade voltada para algumas composições do ser, tanto este como algo inteiro, quanto focado em características íntimas, profundas, coisas de dentro dos seres que latejam para se perceberem, serem algo, entenderem o que tudo é. Seu soneto “Lembrança”, em seu livro “Charneca em flor”, foca na vida de uma lusitana, talvez uma figura ou uma entidade das terras e cultura portuguesas, falando sobre sua existência, caracterizando a mesma, falando da vida a partir de profundas características da figura, mostrando como é a vida desta, com esta.
Conta a história da lusitana tanto cantada em versos, pondo na forma de soneto, pondo a vida desta dentro da forma poética, mostrando a relação entre a poesia e aquela vida, como algo até mesmo trágico se relaciona com a poesia. Tinha seu perfil moreno, lusitano, e olho verdes cor de oceano, sereia nascida dos navegantes. Morou nos paços reais, nas ruas esmolou, foi a que as mãos pálidas poisou no mármore de curvas ogivais. Cantada, fiou o linho na porta dos casais, foi descobrir a Índia e não mais voltou, é a nau que não voltou.
E tudo se dilui em cinzentas brumas, quem dera fosse essa que fora, essas que lembra ter sido dantes.
Narrando as habilidades, a vida, os episódios e, posteriormente o que dela sobrou, não sendo mais o que era dantes, também fala do que é a lembrança, porque existe, o que faz. A lembrança é o ponto mais forte de sua vida por então, devido ser aquilo que a mantém, dentro do possível, presa com aquilo ao qual ela foi, a que a torna maior, mais próxima daquilo que entende. Está com o corpo vivendo e passando, pensando, sentindo, querendo, se percebendo como ser vivo humano, com suas características e interpretações, tendo características de inspiração para os versos, com temas caros a eles. E agora é um corpo de lembranças.