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Pedro Fagundes de Borba

Autor: Pedro Fagundes de Borba

O conto

23/2/2020 - Várzea Paulista - SP

   Ter dentro de histórias simples uma grande complexidade à torna uma obra de disperso e permanente valor, sempre levando para limites extremos o poder das histórias narradas. Quanto mais lidas, mais vezes conseguem-se achar em suas simples estruturas e colocações capacidades de interpretações, principalmente quando desafiam de maneira indefinida e marcada as diversas narrações, dando sempre uma demonstração de faltar algo para se entender. Contos de fadas, além de fazerem muitas outras coisas, fazem isto por várias vezes. O que vou falar é “A menina dos fósforos”, de Hans Christian Andersen. Como este conto é capaz de falar sobre vários pontos ficcionais e não ficcionais, vou fazer uma mescla, comentar sua narrativa, sua forma de ver o mundo, bem como ver a história, que o escritor conta aqui.

  Sentara num canto de parede de uma casa, naquela noite de ano bom, após vender fósforos o dia inteiro, sem nenhum cliente comprar, não querendo voltar, pois o pai bateria nela e além também, assim como num muro em que se encostara, era lá também muito frio. Tinha saído de casa com chinelos, mas, correndo para não ser atropelada por carros à alta velocidade, e por serem grandes, os perdera.

  Estava ali, roxa, congelando de frio. Começou a acender os fósforos, para se aquecer. Ardeu e crepitou muito em sua mão, parecendo uma vela. Imaginou-se sentada em frente uma enorme lareira. Ia estender os pés quando o fósforo se apagou e aquilo desapareceu. Riscou de novo, acendendo outro. Via agora um ganso assado e recheado numa toalha alva. Ele desceu dali, com o garfo e a faca nas costas, cambaleando. Chegando perto dela, o fósforo apagou.  Acendeu outro, desta vez vendo uma gigantesca árvore de natal da casa de um rico comerciante, vendo também estrelas. Uma caiu, trançando um risco de fogo no céu. Lembrou da avó, única pessoa que lhe quisera bem na vida.

  Riscou outro fósforo e ela veio. Pediu para ir com ela, sabendo que, quando apagasse, desapareceria. E riscou rapidamente todos os outros para mantê-la ali, produzindo um clarão mais intenso que a luz do dia. A avó, maior e mais bela do que nunca, ergueu a menina e foram voando pelo céu.

  Raiando o dia, encontraram um pequeno corpo de menina gelado com faces coradas e sorriso brincando nos lábios. Havia morrido de frio na noite de ano velho, agora a aurora do ano novo brilhava sobre o cadáver com fósforos na mão. Comentaram que quisera se aquecer. Nenhum desconfiava das maravilhas que vira ou o esplendor que lhe cercara.

  Andersen conta a história. Acima de qualquer outra coisa, isto. Fazendo assim, por diversos e misteriosos mecanismos narrativos, cria uma que fala de várias formas, pesando todos os aspectos dentro disto, principalmente social, narrativo e mesmo poético. Focando no social, narrar uma dura realidade infantil, associada com tais formas de escrita, leva este ponto a novos espaços, transcendendo complexamente o entendimento, criando novas formas deste. Tendo se uma história assim, ficamos com um relato humano muito próximo da simples complexidade da vida, vista por nós em todos seus momentos mundanos.

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