Autor: Pedro Fagundes de Borba
Como age e o que sabe o indivíduo neste mundo de relações sociais e antagonismos secretos? As relações sociais e as condições de classe, quando não nos determinam por inteiro a consciência, no mínimo nos limitam alguns movimentos. Como somos apenas seres individuais convivendo com nossos coletivos, cabe-nos saber o que queremos e agir para atingir, sempre compreendendo, por inteiro, o que nos cerca. Independente do tipo de regime político em que estivermos este conselho é válido, pois a sociedade é feita de instituições, de subentendidos e de condições de poder. Keuner, personagem criado por Bertolt Brecht, agia desta forma. Mesmo sendo comunista ortodoxo, a literatura de Brecht está longe de representar apenas as condições e caminhos do capitalismo, sendo válido para pensar as formas de organização humana, assim como fazem os textos de Karl Marx.
Quando um professor de filosofia foi até o Sr. Keuner falar de sua sabedoria, percebeu-se que sentava de modo incômodo, falava incômodo e pensava incômodo. O professor disse que falasse sobre o conteúdo que falara. Não havia, retrucou Keuner. Não possuía objetivo algum, falava em maneira obscura, nada tendo para esclarecer. Não havia interesse de Keuner no objetivo filosófico, vista a postura. Por mais discordante que o professor pudesse ser, haveria de haver algum objetivo, algo que dialogasse com Keuner, mesmo que fosse para contradizê-lo, mas que considerasse o mundo, o que ocorre, como pessoas são; com isto, dialogasse. Possuía, no entanto, um objetivo obscuro, para o qual tentava persuadir Keuner através de uma filosofia sem postura, sem respeito, evitando ao máximo considerar a realidade e suas limitações.
Após participar de uma reunião em um clube, Keuner contou a seguinte história: em X, cidade grande, havia o clube Rumpf. O costume era, após uma ótima refeição, pronunciar a palavra Rumpf algumas vezes. Pertenciam ao clube pessoas que nem sempre conseguiam esconder suas opiniões, mas que passavam pela experiência de terem suas palavras mal entendidas. Sr. Keuner ficou sabendo, no entanto, que Rumpf fora mal entendido por alguns, estes achavam que a palavra não significava nada. Quando não se tem suas palavras bem entendidas, é comum se formar uma confusão e uma alienação interna, sobre si mesmo, sobre sua relevância e entendimento externo. Os membros tentaram mudar isto com sua palavra de tão amplo sentido. E alguns achavam que nada significava, aumentando o mal entendido.
Também Keuner dizia que aquele que pensa não usa luz, pão ou pensamento a mais. Como o ato de pensar é uma parte da sociedade, não necessariamente irá levar a mudanças. Realmente, embora fundamental para alguma compreensão profunda, Keuner certamente filosofa muito, pode ser usado para nada, para esclarecer ou para obscurecer; o pensamento é uma compreensão que não necessariamente significará compreensão do que temos ao nosso redor, físico ou metafísico. Precisará, de fato, ser coerente com o que existe, caso queira algo. Seu pensamento, resultando ou não em ação direta, pode ajudar. Ou ser apenas ideia inútil, falsa e demagógica.
O Sr. Keuner é completo pela maneira como se percebe no mundo. Sabe que é, principalmente, alguém que passa por aqui e vive dentro de relações sociais, capitalistas no caso dele. Ele conhece profundamente pessoas, o que elas são e o que os influencia, principalmente o que cada pensa dele. Sabendo-se como pessoa também, tendo acesso à sua individualidade, vive a vida explorando o que quer ao poder, sendo ser muito influenciado pelo meio em que está, mas com características próprias, capaz de viver onde for parar. É o ser humano completo, especialmente nos tempos atuais.